Ano 10| Nr.93 |Jul 2025
Editorial
Nesta edição, destacamos um artigo recentemente publicado na Travel Medicine and Infectious Diseases, intitulado Aedes-borne arboviral human infections in Europe from 2000 to 2023: A systematic review and meta-analysis.1
Para todos os profissionais que trabalham em Medicina do Viajante, manterem-se atualizados sobre os padrões de transmissão de arboviroses é essencial. Só assim é possível prestar aconselhamento preciso e contextualizado aos viajantes. Além disso, a capacidade de antecipar riscos emergentes torna-se particularmente importante, tendo em conta que a notificação de casos nem sempre ocorre de forma imediata e paralela ao aparecimento dos mesmos. Por fim, o reconhecimento precoce de uma infeção num viajante depende, em grande medida, do conhecimento atualizado sobre os destinos de risco.
Entre os arbovírus transmitidos por mosquitos do género Aedes, destacam-se os vírus da dengue, zika, chikungunya, febre amarela, Mayaro, do rio Ross e do Vale do Rift.
O artigo em questão analisa dois contextos distintos de transmissão: os casos autóctones ocorridos na Europa e os casos importados de outras regiões. A transmissão autóctone de arboviroses em solo europeu é muitas vezes negligenciada, sendo por vezes encarada como uma raridade. No entanto, a sua presença tem vindo a crescer, e deve ser reconhecida como uma realidade. Já os casos importados exigem um conhecimento atualizado dos destinos de maior risco, para que as recomendações feitas na consulta de Medicina do Viajante sejam fundamentadas e atuais.
No que diz respeito à transmissão autóctone, os países europeus que registaram casos entre 2000 e 2023 foram Portugal (na Madeira), Espanha, Itália, França e Croácia. França destaca-se por ser o único país com casos autóctones dos três principais arbovírus transmitidos pelo mosquito do género Aedes: dengue, zika e chikungunya. Em Portugal, os casos autóctones de dengue ocorreram maioritariamente durante o surto na Madeira em 2012. Em Itália, salientam-se os surtos de chikungunya em 2007 e 2017.
Apesar de não haver ainda um padrão temporal bem definido para a transmissão autóctone, os surtos referidos demonstram que a presença do vetor em solo europeu já permitiu o aparecimento várias cadeias de transmissão local. Esta realidade adquire especial relevância num momento em que o número de turistas internacionais em países europeus atingiu os 125 milhões no primeiro trimestre de 2025 – um aumento de 5% relativamente ao mesmo período no pré-pandemia.
Até ao momento, não foram registados casos autóctones de vírus como Mayaro, febre amarela, rio Ross ou Vale do Rift. No entanto, a presença comprovada do vetor em várias regiões da Europa, aliada ao crescente fluxo de viajantes internacionais, torna plausível o aparecimento de casos no futuro próximo. A pergunta deixou de ser “se vai acontecer”, passando a ser “quando”.
Quanto aos 55,924 casos importados de arboviroses, 23 países europeus notificaram somente casos de dengue – um número significativamente superior aos cinco com transmissão local – França contou com 8082 casos importados de dengue, Alemanha com 7428 casos e Espanha com 2258 casos. Estes casos importados representam um risco duplo: por um lado, constituem uma possível fonte de introdução de transmissão local em novas áreas onde o vetor está presente; por outro, representam um risco em contextos clínicos específicos, como a transfusão sanguínea ou mesmo transmissão materno-fetal.
A origem dos casos importados não surpreende. De facto, a maioria teve origem em países tropicais endémicos, onde os vírus circulam de forma persistente. O vírus dengue foi sobretudo importado de países da Ásia e Sudeste Asiático, incluindo Tailândia, Índia e Indonésia. O vírus zika foi maioritariamente importado das ilhas de Guadalupe e Martinica, explicando o elevado número de casos registados em França. Já o chikungunya foi frequentemente associado à República Dominicana – um destino turístico popular entre os portugueses –, mas também à Índia e Tailândia.
Na globalidade a prevalência das arboviroses mencionadas foi de 5% nos viajantes que regressaram com sintomatologia.
A previsão aponta para um aumento da transmissão autóctone de arbovírus na Europa nos próximos anos, em grande parte impulsionado pelas alterações climáticas. O aumento das temperaturas médias, especialmente no inverno, favorece a sobrevivência e replicação dos mosquitos do género Aedes, assim como a própria replicação viral no vetor. Simultaneamente, os fluxos de viajantes internacionais continuam a aumentar – no primeiro trimestre de 2025, o número de viajantes na região Ásia-Pacífico e nas Américas cresceu 12% e 2%, respetivamente, em comparação com o ano anterior.2 Este cenário reforça a probabilidade de novas introduções virais em território europeu.
De facto, o futuro parece já ter chegado: o primeiro caso de dengue autóctone foi recentemente reportado em Ibiza, um dado que evidencia a facilidade com que estas transmissões podem ocorrer.
Assim, mais do que nunca, é fundamental manter a vigilância, atualizar as recomendações em consulta e reconhecer a importância crescente das arboviroses no contexto europeu.
1. Hedrich N, Bekker-Nielsen Dunbar M, Grobusch MP, Schlagenhauf P. Aedes-borne arboviral human infections in Europe from 2000 to 2023: A systematic review and meta-analysis. Travel Med Infect Dis. 2025 Mar-Apr;64:102799. doi: 10.1016/j.tmaid.2025.102799. Epub 2025 Jan 10. PMID: 39800038.
2. World Tourism Organization (2025), World Tourism Barometer, volume 23, issue 2, May 2025, UN Tourism, Madrid, DOI: https://doi.org/10.18111/wtobarometereng
Tomás Robalo Nunes
Assistente de Doenças Infecciosas, Hospital Garcia de Orta, Unidade Local de Saúde Almada – Seixal, EPE
Assistente Convidado, Clínica Universitária de Doenças Infecciosas, Faculdade de Medicina da Universidade de Lisboa
A História da SPMV Contada por Todos Nós – Partilhe as Suas Memórias!
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Gabriela Saldanha
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